jueves, 10 de septiembre de 2009

Roda - Influencias externas


A Escrita-de-Roda e Influências Externas
Explicou-me um conhecido mestre de capoeira (1990) que Paraná, citado na conhecida cantiga, foi o mestre baiano que introduziu a capoeira no estado do Paraná, merecendo por isso aquele nome. Eu então lhe perguntei em que época isso se deu, e ele apontou-me para a década de (19)50, quando grande número de baianos foram trabalhar nas frentes de colonização do Paraná. A força dos detalhes que acompanham a informação seria perfeitamente crível se eu não soubesse tratar-se Paraná da canhoneira tripulada por capoeiristas baianos que combateu na Guerra do Paraguai (1865-1870). Dessa forma, a educação oral metamorfoseia e reinventa a história das culturas não-escritas, dando-lhes os elementos de atualidade que elas necessitam para ter credibilidade para pessoas sem educação formal. A guerra do Paraguai está longe, mas a colonização do Paraná está perto. Isso em nada desmerece a tradição narrada, porque tal nova enrredação mítica preserva a tradição que é possível preservar. Isso também se dá no plano religioso.
Certo chefe religioso da África Ocidental, explicando-me o jogo de Ifá, disse-me que seu fundador, cuja coluna vertebral não se sustinha, jogava para trás os elementos da adivinhação por este motivo, quando saiu de Meca para dirigir-se à Nigéria.
Ora, o jogo de Ifá já existia quando Meca não havia sido fundada. O islamismo data apenas do século sétimo da era cristã e não tem qualquer precedência temporal sobre as religiões afro antigas, de que é, na verdade, um subproduto gerado desde a influência do antigo Egito no mundo da península arábica. A Nigéria é uma formadora mais antiga de religião do que sabem seus altos sacerdotes. Eles apenas reinventam a tradição e devem fazê-lo sob a pressão do islamismo, que paradoxalmente se torna assim um elemento de credibilidade para atualizar a tradição no tempo coetâneo. É por essa razão também que a cultura criada pelo povo não é primitiva, pois cada geração a recria, para conformar-se a suas dificuldades ambientais, étnicas e sociais.
Portanto, formar discípulo é uma tarefa cuja centralidade requer a adaptação da tradição a necessidade vivas, sendo o ambiente real em que a cultura se mantém atuante. É interessante observar que a capoeira dura desapareceu no Rio de Janeiro na década de (19)70, quando ela deixou de formar discípulos. De certa forma, ela sofreu naquela mesma década uma reinvenção, através do famoso Nastor Capoeira e, em certa extensão, pelo mestre Quarentinha, que recuperou alguns de seus movimentos para a capoeira angola. Vê-se que a independência do mestre não apenas transforma culturalmente uma linha de capoeira, como pode chegar a mudar o destino de um ramo específico da mesma. O mestre não apenas fornece ao aluno os meios para se desenvolver e personalizar a forma de luta, como fornece os valores que permitem ler o passado e construir o futuro. A chave de tais elementos se encontra na prática da escrita-de-roda.
O mesmo se poderia dizer das supostas relações dos jogos de varapau e de savate e a capoeira dura. Os jogos de varapau já existiam na cultura européia e asiática antigas, há dois mil anos, e atingiram na Europa grande difusão até o século 18. O savate, luta francesa com os pés das pessoas pobres, foi retomado por sobreviventes da aristocracia francesa, quando o governo da Revolução (fim do século 18) proibiu o uso da espada por civis em lugares públicos. Os nobres sobreviventes, tendo a frente a famigerada “juventude dourada”, formou círculos de auto defesa, em que se desenvolveu a técnica do savate e do seu inseparável jogo de bengalas. A bengala passava no savate e ser uma arma mortífera.

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