miércoles, 17 de noviembre de 2010

A FORMAÇÃO DO CENÁRIO CONTEMPORÂNEO DA CAPOEIRA.

Os Desafi os Contemporâneos da Capoeira. Luiz Renato Vieira e Matthias Röhrig AssunçãoA FORMAÇÃO DO CENÁRIO CONTEMPORÂNEO DA CAPOEIRA. Voltemos um pouco no tempo, para explicar melhor a emergência da capoeira contemporânea. No início dos anos 1970, os capoeiristas ainda tinham algo de exótico.

A própria capoeira era vista como uma manifestação cultural que buscava se afi rmar como esporte, cujo lugar “natural” seriam as comunidades mais pobres e periféricas, de população predominantemente afrodescendente. Em instituições mais elitizadas, a capoeira ainda causava extrañeza e, de fato, muitas delas fechavam suas portas para essa prática. Era necessário, portanto, um grande esforço de “organização”, dando continuidade à trajetória iniciada pelos capoeiras da primeira metade do século XX. Assim, as décadas de 70 e 80 se caracterizam como a época dos grandes projetos relacionados à capoeira, a maioria deles com algum grau de pioneirismo (embora houvesse muitas e importantes iniciativas isoladas anteriores): capoeira na escola, na universidade, para portadores de necessidades especiais, nos cursos de licenciatura em educação física, em institutos de reeducação de menores infratores, como terapia, como “ginástica brasileira” e como objeto de dissertações e teses acadêmicas. Há na literatura sobre a capoeira diversos registros de trabalhos relevantes, em todas essas áreas e em algumas outras e não é nossa proposta aqui enumerá-los. O importante é destacar esse momento de mudança na história contemporânea da capoeira. Foi nas décadas de 70 e 80, também, que a capoeira conquistou seu lugar no cenário esportivo nacional, ainda sob a égide da Confederação Brasileira de Pugilismo, e obtuve reconhecimento de vários órgãos governamentais ligados ao esporte e à educação. No início, as competições de capoeira assemelhavam-se às de outras modalidades de luta, não considerando toda a riqueza da arte, reduzindo-a a um simples esporte de combate. Aos poucos, foi-se cegando a formas mais elaboradas e completas de avaliação
dos capoeiristas e as competições fi caram muito parecidas com as próprias rodas de capoeira. Convém lembrar o papel das competições de capoeira dos Jogos Escolares Brasileiros (JEBs) nesse processo, como laboratório para a construção de uma visão mais global da capoeira.
É importante destacar que os anos 1980 foram também a década da expansão nacional dos grandes grupos de capoeira. 1 Firmou-se esse modelo na organização da nossa arte, apesar dos esforços de alguns pela adoção do modelo tradicional das federações. Esse, sem dúvida, foi o passo que mais se destacou na história contemporânea da capoeira: a consolidação da lógica da organização na forma de grupos, em que o professor ou mestre que se forma e organiza sua escola procura vincular-se a uma instituição já reconhecida no mercado. Pode-se, inclusive, discutir em que medida essa forma de organização contribui para preservar a diversidade e a riqueza cultural da capoeira e para o fortalecimento coletivo da arte como forma de resistência cultural. Outra tendência importante, a partir do início dos anos 1980, foi a revalorização das tradições e dos “velhos mestres”, juntamente com o fortalecimento dos grupos de capoeira angola, que ganharam muito espaço à medida que a comunidade da capoeira começava a questionar os caminhos da desportivização.2 Iniciou-se, assim, uma trajetória de reafricanização da capoeira, principalmente nos centros de prática mais tradicionais, que se refl etiu nas linguagens próprias da capoeira: na musicalidade, na instrumentação musical e até mesmo na abordagem histórica dos pesquisadores, que passaram a acentuar as origens africanas e buscar lutas ancestrais e “irmãs” da capoeira, como a ladja, da ilha caribenha Martinica, e o moringue, do Oceano Índico. O nacionalismo simplista, anteriormente tão forte, passou a dar lugar a uma visão mais global da cultura e do processo de formação da capoeira, inserindo-a na história da resistência dos africanos escravizados e de seus descendentes mundo afora. Viu-se que a capoeira precisava ser tratada como um esporte, mas que a arte não poderia ser reduzida somente ao seu aspecto desportivo. Essa abordagem culturalista, então, foi muito enfatizada a partir dos anos 1980, quando as palavras “resgate” e “bagagem” passaram defi nitivamente a fazer parte do vocabulário comum dos capoeiristas. Sintomaticamente, os capoeiristas, que tinham passado a utilizar atabaques com tarraxas, mais funcionais e fáceis de afi nar, voltaram a preferir os tambores trançados com grossas cordas de sisal. É nessa perspectiva – como cultura, e não como modalidade esportiva – que a capoeira ganha o mundo nos anos 1990. Passada a fase da afi rmação de sua riqueza no Brasil, a capoeira torna-se um fenômeno cultural de massa em escala mundial.
http://www.dc.mre.gov.br/imagens-e-textos/revista-textos-do-brasil/portugues/revista14-mat2.pdf

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